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Mostrando postagens de 2022

Artigo de Demétrio Magnoli, O Globo, 26/12/2022

  Por que Lula escolhe aliança com a direita bolsonarista? Ninguém, exceto militantes fanáticos, tem o direito de continuar a levar a sério o rugido santo do lulismo Gilmar Mendes, operando monocrática e politicamente, torpedeou a chantagem de Arthur Lira , retirando o Bolsa Família do teto de gastos. Lula não precisava mais do Centrão para cumprir suas promessas centrais de campanha. Mas a PEC, explicaram os próceres do PT, era “o Plano A, o B e o C”. Já não se tratava de colocar comida na mesa dos pobres. O plano obsessivo era — e é — cooptar uma ampla facção do bolsonarismo para o governo. Foi por pouco, seis a cinco, e na última hora. A maioria do STF operou juridicamente, resistindo à tentação da politicagem, ao declarar a inconstitucionalidade do “orçamento secreto”. Os negociadores de Lula usaram a decisão para concluir o pacto de aliança com Lira, repartindo ao meio o fruto envenenado. “Genocida!”, “pedófilo!”, “canibal!” — ninguém, exceto militantes fanáticos, tem o direito d

Editorial do Estadão, 24/12/2022 - À imagem e semelhança do PT

Lula e o PT não aprenderam nada. Não almejam um novo governo politicamente aberto e plural. Querem tudo para si, descumprindo sua promessa e ignorando necessidades do país. Depois de uma campanha eleitoral defendendo a necessidade de um governo formado por uma frente ampla e depois de um discurso da vitória no segundo turno afirmando que “esta não é uma vitória minha nem do PT”, é absolutamente decepcionante para o País verificar a composição dos Ministérios que vai sendo delineada pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. Todos os postos decisivos estão a cargo do PT ou de gente que, por mais que esteja circunstancialmente em outra legenda, sempre teve e continua tendo a mesma visão do PT. Desenha-se, portanto, um governo radicalmente petista, justamente o contrário daquilo que foi repetidas vezes prometido. A rigor, ninguém pode dizer que está surpreso com tal situação. O passado petista nunca possibilitou qualquer esperança de um governo do PT politicamente aberto e plural.

Artigo de Reinaldo Azevedo no Uol, 05/12/2022

Aras pode tolerar o golpismo, mas quer prender quem lhe cobra que trabalhe? 05/12/2022 01h38 Uma das coisas essenciais da vida é conservar o decoro. Trata-se da barreira mais eficiente contra o vexame. Demonstra autocontenção e cuidado no cumprimento das regras do jogo. O ato indecoroso, mesmo quando involuntário, tisna também as virtudes verdadeiras e seria capaz de aniquilar até a crença nos santos. É o respingo de molho na veste sacerdotal. Ou o resto de salada no dente do interlocutor que se esforça para "apertar no peito mais humanidades do que Cristo", como escreveu o poeta. Mesmo as prefigurações sublimes exigem certas precondições para a sua eficácia. Felizmente, costumamos saber pouco sobre a humanidade falível dos nossos ídolos. E tudo fica pior quando a perdição não cai da árvore dos acontecimentos, mas é uma escolha. Pode não parecer, mas estou a falar de Augusto Aras, procurador-geral da República, como o título anuncia. Nem tudo o que emana da PGR é desastre, é

Editorial do Estadão, 24/11/2022

Molecagem O PL mostra-se tacanho e golpista ao defender que as urnas cujos votos rejeitaram Bolsonaro não devem ser computadas no resultado final. Não cabe na democracia tal molecagem Notas&Informações, O Estado de S.Paulo 24 de novembro de 2022 | 03h00 Neste ano, o PL elegeu 99 deputados federais e 8 senadores. Com o resultado, a legenda de Valdemar Costa Neto terá, a partir de 2023, a maior bancada da Câmara e do Senado, com 14 senadores ao todo. No entanto, o partido parece não apenas indiferente ao apoio recebido nas urnas, como também alheio à responsabilidade que o voto confere em uma democracia, portando-se como um grupo golpista. Na terça-feira, o PL pediu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a anulação dos votos de 279,3 mil urnas eletrônicas no segundo turno, sob a alegação de “mau funcionamento” do sistema. A ação do PL é um deboche do início ao fim. No sábado passado, ao anunciar a propositura do pedido de anulação, Valdemar Costa Neto reconheceu a lisura e a confia

Artigo de Vera Magalhães, O Globo, 23/11/2022

  Golpismo não pode ficar na conta da piada É de extrema gravidade que o partido do presidente tente melar as eleições em que obteve seu melhor desempenho Por Vera Magalhães 23/11/2022 01h20 Atualizado 23/11/2022 A cada nova casa avançada pelos que intentam questionar o resultado das eleições, o lugar-comum ouvido entre políticos, juízes, advogados e analistas políticos é: — Esquece, isso não vai dar em nada. Mas já deu em muita coisa, e parece haver pouca consciência por parte de todos esses segmentos do grau de radicalização operado pelo bolsonarismo não mais nas franjas da extrema direita, mas em amplos espectros da sociedade. Há quase um mês, centenas de pessoas estão nas ruas desempenhando um ritual entre bizarro e francamente criminoso, que vai de apelos pueris a extra-terrestres a atentados terroristas contra concessionárias de rodovias. Com exceção do Judiciário, todos os demais responsáveis por preservar o Estado Democrático de Direito de acordo com a Constituição tocam a bol

Artigo de Lygia Maria, FSP, 21/11/2022

A Copa é só uma Copa Tratar o futebol sempre sob viés político é ignorar o lado estético e passional do esporte favorito dos brasileiros 20.nov.2022 às 14h00 Começou a Copa do Mundo, ainda bem: finalmente, vamos parar de falar de política. Ledo engano. A politização do mundo da vida, que no Brasil se intensificou com a polarização ideológica desde o impeachment de Dilma Rousseff, parece que veio para ficar. Na última edição do torneio, em 2018, militantes de esquerda alertavam que "Enquanto você grita ‘gol’, eles te exploram!". E, se mesmo explorado, você resolvesse torcer, ainda teria de escolher direito para quem: porque, no maior evento de futebol do planeta, não é o futebol que importa, e sim se a seleção é de país que colonizou povos africanos no século 19. Este ano, sugeriram boicote à seleção brasileira porque alguns jogadores declararam voto em Jair Bolsonaro. Trata-se do mesmo mecanismo que tenta cancelar artistas por causa de suas opiniões políticas. Essa incapacida

Editorial do Estadão, 21/11/2022

A vanguarda do atraso no saneamento Ao sugerir que pode frear os avanços do novo marco em favor de um modelo flagrantemente ineficaz, a equipe do novo governo dá mostras de descolamento da realidade Notas&Informações, O Estado de S.Paulo 21 de novembro de 2022 | 03h00 Guilherme Boulos (PSOL), deputado federal eleito por São Paulo e membro da equipe de transição do governo, fez críticas ao marco do saneamento, aprovado em 2020: “A posição da maior parte dos partidos que sustentam a coligação presidida pelo presidente Lula no próprio Congresso, quando foi votado o marco, é que é muito prejudicial o processo de privatização do saneamento. É muito prejudicial você ter uma agência reguladora como a Agência Nacional de Águas (ANA), com superpoderes e sem controle da sociedade”. Em tom de lamentação, Boulos disse que “revisão legal, a equipe de transição não tem prerrogativa de propor”, mas que proporá revisões infralegais. Enquanto se espera por essas propostas, preocupa desde já o f

Editorial do Estadão, 20/11/2022

Liberdade de expressão não é vale-tudo Após quatro anos de bolsonarismo, é preciso recompor noção e exercício da liberdade de expressão. Há uma ideia equivocada sobre a palavra, como se fosse território da impunidade Notas&Informações, O Estado de S.Paulo 20 de novembro de 2022 | 03h00 Em 1988, o País restabeleceu, por meio da Constituição, a liberdade de expressão, de imprensa e de opinião. A censura da ditadura militar – definindo o que podia e o que não podia ser publicado, exposto ou escrito – ficava, assim, definitivamente extinta. Para impedir eventuais retrocessos no futuro, inseriu-se no texto constitucional uma cláusula pétrea sobre o tema: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais”. Dessa forma, no Estado brasileiro, sempre será “livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (art. 5.º, IV), como sempre será “livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicaçã

Artigo de Cora Rónai, O Globo, 17/11/2022

'Perdeu, mané, não amola' O Brasil anda tão sem rumo quanto a nau que colidiu com a Ponte Rio-Niterói. O país é uma piada pronta, uma metáfora de 52 mil toneladas 17/11/2022 04h30 Atualizado 17/11/2022 Não sei vocês, mas eu, a despeito de ter escrito uma coluna inteira sobre gato na semana passada, estou me sentindo a um passo da borda da Terra plana, num cenário de fim de mundo digno de virada de milênio, com choro, ranger de dentes e procissões de penitentes se açoitando uns aos outros, ao mais fino Monty Python. Tudo está muito esquisito, e o tempo não ajuda: já é novembro, mas ainda outro dia choveu gelo. É para sair de casaco? É para levar guarda-chuva? A guerra contra a Ucrânia, que era para durar uma semana, desandou e sobrou para a Polônia, mas, apesar das manchetes alarmistas e da aflição da vizinhança, ninguém mais está prestando atenção, porque ninguém consegue mais prestar atenção a nada que dure mais do que meia dúzia de episódios. O roteiro da Covid vai pela mesm

Editorial do Estadão, 17/11/2022

  Alimentando a crise moral Lula em jatinho de empresário suspeito, ministro do STF falando de política, FA dando recado ao poder civil, protestos antidemocráticos: o País normaliza o intolerável Notas&Informações, O Estado de S.Paulo 17 de novembro de 2022 | 03h00 O País precisa de paz e serenidade. É urgente a tarefa de pacificação e reconstrução nacional. Diante disso, os principais atores políticos precisam se esforçar um pouco mais para desarmar os espíritos. Devem, sobretudo, dar o bom exemplo de respeito tanto às leis quanto aos padrões éticos, medindo as consequências de seus atos e palavras. Alguns acontecimentos recentes, no entanto, mostram que estamos longe de superar a crise moral que tomou o País de uns anos para cá e que leva cidadãos comuns a acreditar que tudo podem. As eleições indicaram que parte considerável da população – no mínimo 58 milhões de eleitores – continua tendo sérias restrições ao comportamento do petista Lula da Silva. O que faz então o preside

Artigo de Pedro S. Malan o Estadão, 13/10/2022

  Definindo agora contornos do futuro Dívida, tributação, gasto público, eficiência e equidade terão de estar no centro do debate público sobre crescimento pelos cruciais anos à frente. Pedro S. Malan, O Estado de S.Paulo 13 de novembro de 2022 | 03h00 Qualquer governo tem suas cotas de acertos e desacertos. O de Lula não será exceção. O discurso eleitoral eloquente permite-se proferir certezas e promessas de solução para problemas de todo tipo. No entanto, vencidas as eleições, ele deve dar lugar ao pragmatismo responsável a que estão obrigados aqueles que, no exercício do governo, têm de lidar com recursos escassos, conflitos de interesse e com as incertezas, riscos e consequências das decisões a tomar. Quarenta anos atrás, a convite de uma Espanha recém-democratizada, Norberto Bobbio escreveu sobre as transformações da democracia, analisando promessas não cumpridas e contrastes entre a democracia ideal e a democracia real: “Daquelas promessas (...) algumas não podiam ser objetiv

Editorial do Estaddão, 13/11/2022

  Ministros do STF devem ser exemplares Para pacificar o País e preservar a autoridade do Judiciário, é preciso cumprir a Lei Orgânica da Magistratura. Ministro do STF não é personalidade a ser ouvida em evento empresarial Notas & Informações, O Estado de S.Paulo 13 de novembro de 2022 | 03h00 A informação de que seis ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) – Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski – confirmaram presença no evento privado “Lide Brazil Conference”, a ser realizado nos dias 14 e 15 de novembro em Nova York, deve servir de alerta. O Poder Judiciário – em especial, o STF – tem sido alvo, nos últimos anos, de diversos ataques e ameaças antidemocráticas, com o objetivo explícito de tolher a independência da Justiça. Criminosas, essas atitudes merecem repressão rigorosa e punição exemplar. No entanto, sem ser condescendente com qualquer tipo de achaque contra o Supremo, é preciso admitir: o comportam

Editorial do Estadão, 12/11/2022

  Uma nota que não deveria existir Não cabe às Forças Armadas opinar sobre temas civis, muito menos criticar ‘excessos’ dos Poderes constitucionais Notas & Informações, O Estado de S.Paulo 12 de novembro de 2022 | 03h00 A nota conjunta dos comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica sobre “as manifestações populares que vêm ocorrendo em inúmeros locais do País” é o resultado de quatro anos de Jair Bolsonaro na Presidência da República. Desde a redemocratização, as Forças Armadas nunca haviam sido colocadas em tantas situações de constrangimento pelo Executivo federal. Em alguns casos, chegaram a ser instigadas explicitamente a atuar fora das linhas constitucionais; por exemplo, quando Jair Bolsonaro falou de apuração paralela das eleições por militares. É preciso voltar à plena normalidade democrática: as Forças Armadas, precisamente por serem armadas, não se manifestam sobre assuntos civis. Devem ser o Grande Mudo. O comunicado do Alto-Comando dirige-se “às instituiçõ

Editorial do Estadão, 02/11/2022

  O esperneio dos arruaceiros Bolsonaro enfim se pronuncia sobre a eleição – para se queixar de ‘injustiça’ e justificar a baderna de bolsonaristas; entrementes, Ciro Nogueira inicia transição com os petistas Notas&Informações, O Estado de S.Paulo 02 de novembro de 2022 | 03h00 O presidente Jair Bolsonaro afinal se pronunciou, ontem, sobre as eleições em que perdeu para o petista Lula da Silva, no domingo passado. Fiel a seu espírito antidemocrático, não cumprimentou o vencedor. Ao contrário, sugeriu que foi derrotado pelo que chamou de “sistema”, que teria reservado a ele um tratamento “injusto”. Em outras palavras, não reconheceu a lisura do processo eleitoral – como, aliás, fez durante toda a campanha, sem apresentar provas. Pior: com isso, justificou a baderna dos bolsonaristas golpistas que resolveram trancar estradas desde domingo para protestar contra a vitória de Lula. Segundo Bolsonaro, esses arruaceiros estão movidos por um “sentimento de indignação” – e se limitou a di

Editorial do Estadão, 31/10/2022

Lula tem o dever de arrefecer os ânimos Vitória do petista está longe de representar uma solução. Trata-se de um novo desafio, a exigir vigilância e participação democrática. Oposição responsável é imprescindível Notas & Informações, O Estado de S.Paulo 30 de outubro de 2022 | 21h41 Jair Bolsonaro é o primeiro presidente da República que, tendo disputado a reeleição, não foi reconduzido ao cargo. A maioria do eleitorado rejeitou neste domingo um governo que se mostrou, desde o primeiro momento, conflituoso, desumano e assustadoramente destrutivo. Eleito em 2018 sob a bandeira do antipetismo e do combate à corrupção, Jair Bolsonaro mostrou-se incapaz não apenas de cumprir minimamente um programa de governo, mas de se portar como presidente da República em suas mais básicas exigências legais e cívicas. Se é um imenso alívio pensar que o Brasil não terá, pelos próximos quatro anos, Jair Bolsonaro na Presidência da República, é preciso reconhecer que o resultado das eleições deste do

Editorial do Estadão, 27/10/2022

Constituição de 1988, caminho de paz É urgente a tarefa de pacificação nacional, que inclui respeitar as liberdades fundamentais e prover uma mais madura compreensão da independência e harmonia entre os Poderes Notas&Informações, O Estado de S.Paulo 27 de outubro de 2022 | 03h00 Se há uma necessidade consensual para 2023, seja quem for o presidente eleito no domingo, é a pacificação nacional. Para este jornal, não há desenvolvimento social e econômico possível com tanto conflito, com tanta agressividade, com tanto atrito entre os Poderes. O que ocorreu nos últimos quatro anos no País foi absolutamente disfuncional. Por isso, consideramos que o Brasil precisa urgentemente de paz – e isso é uma tarefa de todos; muito especialmente, de quem exerce autoridade no Executivo, no Legislativo e no Judiciário. A dimensão da tarefa pacificadora pode causar certa perplexidade. Pode-se ter a impressão de ser uma empreitada difícil demais, em que as pontes de diálogo, racionalidade e equilíbri

Primeiro editorial do Estadão, 26/10/2022

  Que democracia? A democracia é a melhor forma de governo para 79% dos brasileiros, mas os mesmos eleitores apoiam um candidato que admira ditaduras e outro que defende direitos só para ‘maioria’ Notas & Informações, O Estado de S.Paulo 26 de outubro de 2022 | 03h00 O Datafolha acaba de publicar uma pesquisa que aponta que 79% dos brasileiros consideram que a democracia é sempre melhor do que qualquer outra forma de governo. Trata-se do maior índice de aprovação do regime das liberdades desde o início da série histórica, em 1989. O apoio a uma ditadura “em certas circunstâncias” une 5% dos respondentes, o menor porcentual já registrado pelo instituto. Já os que acham que “tanto faz” entre democracia e ditadura somam 11%. É alvissareiro, não resta dúvida, que a esmagadora maioria da sociedade apoie a democracia, sobretudo porque esse resultado foi aferido a menos de dez dias do segundo turno da eleição presidencial. E esta não é uma eleição trivial. De um lado, o presidente e can