Editorial de O Globo, 15/09/2022

Agressões a jornalistas são inadmissíveis

Deputado bolsonarista que agrediu colunista do GLOBO deveria ser expulso do partido e da Assembleia


Por Editorial
15/09/2022 00h05 Atualizado 15/09/2022


São inadmissíveis em quaisquer circunstâncias agressões como a sofrida pela jornalista Vera Magalhães, colunista do GLOBO e apresentadora da TV Cultura, no debate entre candidatos ao governo de São Paulo na noite de terça-feira. Vera foi alvo de ataques do deputado estadual bolsonarista Douglas Garcia (Republicanos), integrante da comitiva do candidato a governador Tarcísio de Freitas.


Num momento em que ela trabalhava numa área reservada à imprensa, Garcia se aproximou e, gravando a cena munido de um celular, passou a xingá-la, a cobrar a divulgação de informações sobre sua remuneração — que já é pública — e repetiu uma frase agressiva e descabida usada pelo presidente Jair Bolsonaro em resposta a uma pergunta de Vera no último debate presidencial. Só pôde ser contido pela segurança do evento. Vera teve de sair escoltada do Memorial da América Latina, onde era realizado o debate.


Tarcísio depois se desculpou em nome dele e de sua campanha. O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) também condenou o ataque em redes sociais. São manifestações desejáveis e esperadas ante tal absurdo. Infelizmente, insuficientes, pois não se trata de evento isolado. Há uma articulação contra profissionais da imprensa entre militantes que aprovam e reproduzem a atitude violenta recorrente de Bolsonaro diante de jornalistas que o desagradam. Nas manifestações do último 7 de Setembro havia faixas com slogans contra Vera — e ela está longe de ser o único alvo de ataques abjetos, dirigidos sobretudo contra mulheres, numa prova eloquente do machismo covarde que contamina a campanha bolsonarista.


Nenhum dos candidatos, é verdade, gosta das perguntas incômodas feitas por jornalistas profissionais. Bolsonaro prefere a adulação de seus braços de propaganda travestidos de veículos jornalísticos na forma de blogs, canais de vídeo na internet ou redes de televisão dóceis. Mas o papel do jornalismo profissional numa campanha eleitoral é justamente fazer perguntas incômodas. É desmascarar as mentiras da propaganda dos candidatos para informar melhor o eleitorado.


A reação de acólitos de Bolsonaro como Garcia vai muito além do aceitável. Mentir, xingar e agredir são comportamentos intoleráveis num ambiente de debate livre e democrático. Quem se comporta assim não está à altura do mandato de que foi investido. Garcia deveria, por isso, ser expulso do partido, da Assembleia Legislativa e sofrer as punições mais rigorosas cabíveis nos termos da lei.


Não pode haver espaço para ataques contra profissionais de imprensa em plena campanha eleitoral, quando o trabalho dos jornalistas se torna ainda mais necessário e essencial. Ao ofender e ao tentar constranger Vera, uma das jornalistas mais respeitadas do país, os bolsonaristas atentam contra toda a imprensa profissional, contra a democracia e contra as liberdades de que se proclamam defensores. Para além das desculpas de Tarcísio e do repúdio manifestado por outros políticos e candidatos, é preciso que esse tipo de comportamento seja combatido com firmeza pelo próprio Bolsonaro, de quem tem partido o incentivo velado aos ataques.

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