Triste realidade
Vou-me embora pra Bruzundanga
11 de fevereiro de 2013 | 11h 04
11 de fevereiro de 2013 | 11h 04
Marco Antonio Villa
O Brasil é um país fantástico. Nulidades são transformadas em gênios da noite
para o dia. Uma eficaz máquina de propaganda faz milagres. Temos ao longo da
nossa História diversos exemplos. O mais recente é Dilma Rousseff.
Surgiu no mundo político brasileiro há uma década. Durante o regime militar
militou em grupos de luta armada, mas não se destacou entre as lideranças. Fez
política no Rio Grande do Sul exercendo funções pouco expressivas. Tentou fazer
pós-graduação em Economia na Unicamp, mas acabou fracassando, não conseguiu
sequer fazer um simples exame de qualificação de mestrado. Mesmo assim, durante
anos foi apresentada como "doutora" em Economia. Quis-se aventurar no mundo de
negócios, mas também malogrou. Abriu em Porto Alegre uma lojinha de mercadorias
populares, conhecidas como "de 1,99". Não deu certo. Teve logo de fechar as
portas.
Caminharia para a obscuridade se vivesse num país politicamente sério. Porém,
para sorte dela, nasceu no Brasil. E depois de tantos fracassos acabou premiada:
virou ministra de Minas e Energia. Lula disse que ficou impressionado porque
numa reunião ela compareceu munida de um laptop. Ainda mais: apresentou um
enorme volume de dados que, apesar de incompreensíveis, impressionaram
favoravelmente o presidente eleito.
Foi nesse cenário, digno de O Homem que Sabia Javanês, que Dilma passou pouco
mais de dois anos no Ministério de Minas e Energia. Deixou como marca um
absoluto vazio. Nada fez digno de registro. Mas novamente foi promovida. Chegou
à chefia da Casa Civil após a queda de José Dirceu, abatido pelo escândalo do
mensalão. Cabe novamente a pergunta: por quê? Para o projeto continuísta do PT a
figura anódina de Dilma Rousseff caiu como uma luva. Mesmo não deixando em um
quinquênio uma marca administrativa - um projeto, uma ideia -, foi alçada a
sucessora de Lula.
Nesse momento, quando foi definida como a futura ocupante da cadeira
presidencial, é que foi desenhado o figurino de gestora eficiente, de profunda
conhecedora de economia e do Brasil, de uma técnica exemplar, durona, implacável
e desinteressada de política. Como deveria ser uma presidente - a primeira - no
imaginário popular.
Deve ser reconhecido que os petistas são eficientes. A tarefa foi dura, muito
dura. Dilma passou por uma cirurgia plástica, considerada essencial para, como
disseram à época, dar um ar mais sereno e simpático à então candidata. Foi
transformada em "mãe do PAC". Acompanhou Lula por todo o País. Para ela - e só
para ela - a campanha eleitoral começou em 2008. Cada ato do governo foi motivo
para um evento público, sempre transformado em comício e com ampla cobertura da
imprensa. Seu criador foi apresentando homeopaticamente as qualidades da
criatura ao eleitorado. Mas a enorme dificuldade de comunicação de Dilma acabou
obrigando o criador a ser o seu tradutor, falando em nome dela - e violando
abertamente a legislação eleitoral.
Com base numa ampla aliança eleitoral e no uso descarado da máquina
governamental, venceu a eleição. Foi recebida com enorme boa vontade pela
imprensa. A fábula da gestora eficiente, da administradora cuidadosa e da chefe
implacável durante meses foi sendo repetida. Seu figurino recebeu o reforço,
mais que necessário, de combatente da corrupção. Também, pudera: não há na
História republicana nenhum caso de um presidente que em dois anos de mandato
tenha sido obrigado a demitir tantos ministros acusados de atos lesivos ao
interesse público.
Com o esgotamento do modelo de desenvolvimento criado no final do século 20 e
um quadro econômico internacional extremamente complexo, a presidente teve de
começar a viver no mundo real. E aí a figuração começou a mostrar suas
fraquezas. O crescimento do produto interno bruto (PIB) de 7,5% de 2010, que foi
um componente importante para a vitória eleitoral, logo não passou de uma
recordação. Independentemente da ilusão do índice (em 2009 o crescimento foi
negativo: -0,7%), apesar de todos os artifícios utilizados, em 2011 o
crescimento foi de apenas 2,7%. Mas para piorar, tudo indica que em 2012 não
tenha passado de 1%. Foi o pior biênio dos tempos contemporâneos, só ficando à
frente, na América do Sul, do Paraguai. A desindustrialização aprofundou-se de
tal forma que em 2012 o setor cresceu negativamente: -2,1%. O saldo da balança
comercial caiu 35% em relação à 2011, o pior desempenho dos últimos dez anos, e
em janeiro deste ano teve o maior saldo negativo em 24 anos. A inflação dá
claros sinais de que está fugindo do controle. E a dívida pública federal
disparou: chegou a R$ 2 trilhões.
As promessas eleitorais de 2010 nunca se materializaram. Os milhares de
creches desmancharam-se no ar. O programa habitacional ficou notabilizado por
acusações de corrupção. As obras de infraestrutura estão atrasadas e
superfaturadas. Os bancos e empresas estatais transformaram-se em meros
instrumentos políticos - a Petrobrás é a mais afetada pelo desvario
dilmista.
Não há contabilidade criativa suficiente para esconder o óbvio: o governo
Dilma Rousseff é um fracasso. E pusilânime: abre o baú e recoloca velhas
propostas como novos instrumentos de política econômica. É uma confissão de que
não consegue pensar com originalidade. Nesse ritmo, logo veremos o ministro
Guido Mantega anunciar uma grande novidade para combater o aumento dos preços
dos alimentos: a criação da Sunab.
Ah, o Brasil ainda vai cumprir seu ideal: ser uma grande Bruzundanga. Lá, na
cruel ironia de Lima Barreto, a Constituição estabelecia que o presidente "devia
unicamente saber ler e escrever; que nunca tivesse mostrado ou procurado mostrar
que tinha alguma inteligência; que não tivesse vontade própria; que fosse,
enfim, de uma mediocridade total".
* HISTORIADOR, É PROFESSOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
(UFSCAR)
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