O roteiro da farsa elétrica

A conta da luz!

Estava pensando de onde viria o recurso para o governo bancar a redução das tarifas de energia. Antes o custo fiscal seria de R$ 3 bilhões e, agora, esse custo foi elevado para R$ 8,4 bilhões. Excelente, mas de onde vem o dinheiro?
Simples, vem do “Brasil do futuro”. Explico. No ano passado o governo quando editou a MP 600, de 28 de dezembro de 2012, colocou lá no Art. 7o o seguinte:
Art. 7º Fica a União autorizada a ceder onerosamente ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, e suas controladas, direitos de crédito detidos pelo Tesouro Nacional contra a Itaipu Binacional.
§ 1º O pagamento devido pelo BNDES pela cessão de que trata o caput poderá ser efetivado em títulos da dívida pública mobiliária federal ou ações de sociedades anônimas, exceto as integrantes de instituições pertencentes ao Sistema Financeiro Nacional, respeitada a equivalência econômica da operação, sendo o ajuste de eventual diferença paga em moeda corrente pelo BNDES à União.
§ 2º A operação deverá ser formalizada mediante instrumento contratual a ser firmado pelas partes.
§ 3º Fica a União autorizada a destinar, à Conta de Desenvolvimento Energético – CDE, no todo ou em parte, os recursos financeiros provenientes da cessão onerosa de que trata o caput.
§ 4º Fica a União autorizada a celebrar contratos com o BNDES com a finalidade de excluir os efeitos da variação cambial incidentes nos direitos de crédito de que trata o caput.
O que isso significa exatamente? Significa que o governo tem a autorização legal para vender para o BNDES créditos que tem a receber no futuro da Itaipu. Ou seja, utiliza-se um receita futura para financiar uma despesa corrente – parte da conta de desoneração das tarifas elétricas hoje.
Se isso vale para a desoneração do setor de energia, o que garante que no futuro não se use o mesmo “truque” (transformar receita futura em receita primária corrente) para aumentar outros tipos de despesa?
E para piorar a situação, como o BNDES não tem recurso sobrando e precisou de novos empréstimos do Tesouro no ano passado, na prática, isso significa que o tesouro fez a seguinte sequencia de operações:
(1) Emite títulos (aumenta a divida bruta) e repassa o recurso para o BNDES – sem impacto na Div. Liquida do Setor Publico porque a operação gera um débito (aumento da divida bruta) e um crédito (empréstimo ao BNDES);
(2) No período seguinte, o Tesouro pega parte dos recursos que iria receber no futuro de Itaipu e vende hoje para o BNDES, que pode pagar com os mesmos títulos que recebeu do governo, que teve como fonte de origem o aumento da divida bruta;
(3) Resultado final, o governo traz para o presente receita futura e, adicionalmente, aumenta a divida bruta que se transforma em receita primária.
Dois pontos muito rápido. Primeiro, usar receita futura para pagar gastos correntes definitivamente não é algo recomendado. Segundo, o Brasil já tem uma dívida bruta elevada. Pela metodologia do FMI, que leva em conta os títulos públicos na carteira do Banco Central, a divida bruta do Brasil, em 2011, foi de 65% do PIB.
Se usarmos as estatísticas do FMI para fazer comparações internacionais, a dívida bruta do setor público no Brasil não é baixa. Em 2010-2011, essa divida em outros países era de: México (43,8% do PIB), Colômbia (36% do PIB), Equador (18% do PIB), Peru (20,92% do PIB) e Chile (11,25% do PIB).
Uma dívida bruta de 65% do PIB (conceito do FMI) é semelhante ao nível de endividamento de países como Espanha e EUA antes da crise. Em 2007, a dívida bruta dos EUA era de 67,1% do PIB, valor um pouco acima da divida bruta do Brasil, em 2011.
Mas claro que alguns dirão que não é preciso se preocupar com a divida bruta porque o Brasil é um país maior do que os outros da América Latina e tem uma “situação melhor” do que os EUA – aquele país que tem uma renda per capita de US$ 48 mil e uma carga tributária “enorme” de 25% do PIB.

Fonte: http://mansueto.wordpress.com/

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