O governo dos incomPeTentes
Editoral do Estadão de hoje
Choque de incompetência
06 de dezembro de 2012 | 2h 07
Choque de incompetência
06 de dezembro de 2012 | 2h 07
O Estado de S.Paulo
Incompetência, autoritarismo e uma espantosa desinformação condenaram o
governo federal ao fracasso em seu plano de antecipar a renovação de concessões
do setor elétrico. Se ainda houvesse alguma dúvida, teria sido eliminada pelo
secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, na
entrevista coletiva de terça-feira à tarde. "Essas companhias privilegiaram seus
acionistas e não a população brasileira", disse ele, referindo-se à Cesp, à
Cemig e à Copel, como se a decisão dessas empresas de rejeitar a proposta do
governo fosse, além de surpreendente, censurável. É quase incrível, mas o número
dois de um Ministério responsável por grandes sociedades por ações, como a
Petrobrás e a Eletrobrás, parece desconhecer as obrigações de empresas desse
tipo em relação aos detentores de seus papéis. Mas a aparente surpresa do
secretário, embora chocante no primeiro momento, combina perfeitamente com o
estilo de ação seguido pela cúpula federal nessa e em várias outras iniciativas
desastradas.
A Fazenda paulista detém 94,08% das ações ordinárias da Cesp e, juntamente
com outras entidades ligadas ao governo do Estado, 40,6% do capital. A maior
parte está distribuída entre vários acionistas, incluída a Eletrobrás (2,05%).
Os papéis são negociados na Bovespa e no mercado de balcão americano. As ações
do Grupo Cemig, controlado pelo governo de Minas Gerais, estão espalhadas entre
114 mil investidores em 44 países e são negociadas em São Paulo, Nova York e
Madri.
O secretário executivo do Ministério teria encontrado ideias esclarecedoras
se tivesse visitado o portal eletrônico da Cemig. A declaração sobre "missão,
visão e valores" inclui referências a "dividendos, juros sobre capital próprio,
agregação de valor, capacidade de geração de caixa e retorno sobre
investimento". Sua responsabilidade social cobre a oferta de energia à
sociedade, o respeito ao meio ambiente e também aos "clientes, colaboradores,
acionistas, governos e comunidades". Rentabilidade, geração de caixa e respeito
aos acionistas são condições para o bom atendimento de todos os princípios e
valores enunciados.
O governo federal, no entanto, segue ideias diferentes ao decidir o destino
das empresas sob seu controle, sem levar na devida conta os interesses dos
demais acionistas. A adesão da Eletrobrás ao esquema proposto pelo Ministério de
Minas e Energia foi decidida contra a opinião de minoritários. Apesar de seus
protestos indiscutivelmente legítimos, esse grupo foi desconsiderado e o governo
impôs sua vontade. O alerta para o mercado é inequívoco: investir em estatais
controladas pela União é assumir riscos muito sérios de perda de patrimônio.
Perdas já ocorreram com a redução do valor de mercado da Eletrobrás, iniciada há
meses e acelerada a partir de setembro, quando a presidente Dilma Rousseff
anunciou a proposta de renovação das concessões. A adesão da empresa ao esquema
oficial justifica mais preocupações. Mas ninguém deveria surpreender-se. Quantos
danos foram impostos à Petrobrás, com o controle de preços de combustíveis e com
a interferência desastrosa em seus planos de investimento?
Bons propósitos, como o barateamento da energia, são insuficientes para a
produção de bons resultados. Competência ainda é um requisito importante, mas
esse artigo continua muito escasso em Brasília. O governo tenta compensar essa
deficiência apelando cada vez mais para o voluntarismo e o autoritarismo. Todos
querem contribuir para a redução das tarifas de energia, "mas é um risco, uma
imprudência, quase um desatino", fazer isso à custa da insolvência do setor,
disse o senador Aécio Neves.
Especialistas conhecidos também se manifestaram contra a maneira de agir do
governo. A proposta oficial não levou em conta o valor necessário para as
empresas manterem a qualidade do sistema, disse o professor Luiz Pinguelli Rosa,
do Coppe-UFRJ. O professor Ildo Sauer, da USP, atribui à presidente Dilma
Rousseff uma política de argentinização do setor elétrico. É uma descrição tão
apropriada quanto assustadora. Os industriais deveriam levá-la em conta, antes
de reafirmar seu apoio ao novo desatino federal.
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