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Mostrando postagens de 2025

Artigo de Fernando Schuler, Estadão, 20/09/2025 - "Não há censura no Brasil?"

Não há censura no Brasil? Listo dez casos dos últimos anos Muitos cidadãos foram agredidos, em seus direitos, e isto jamais deveria acontecer em nossa democracia Por Fernando Schüler 20/09/2025 | 09h00 “No Brasil não existe censura”, disse o ministro Barroso , esta semana, na abertura de uma sessão do STF. A declaração me surpreendeu. Tenho apreço pelo ministro, de modo que dou uma resposta popperiana: listo dez casos de censura, no Brasil dos últimos anos. Se eles não existirem, está tudo bem. Mas se eles forem reais, quem sabe vale refletir sobre o que vem se passando, afinal, em nossa democracia. O primeiro é o ato inaugural. Muita gente acha que os inquéritos surgiram para salvar a democracia, mas não. Foi para censurar uma revista, em 2019 . Depois vem o caso do PCO. Um tuíte que quase ninguém leu, um “ataque” ao STF, quem sabe em nome da justiça soviética, e o minúsculo partido comunista foi apagado . O terceiro é o professor Marcos Cintra. Tuíte elegante sobre o resultado de alg...

Editorial do Estadão, 10/09/2025 - "Bolsonaro não vale uma missa"

  Bolsonaro não vale uma missa Os partidos devem refletir se vale a pena ampliar as tensões institucionais, paralisando o País neste momento importante, só para livrar da cadeia um desqualificado como o ex-presidente Ao aceitar pagar o preço de se converter ao catolicismo para ser coroado rei da França, o protestante Henrique de Navarra, em 1593, saiu-se com esta: “Paris bem vale uma missa”. E Jair Bolsonaro, vale uma missa? Em outras palavras: vale a pena ampliar as tensões institucionais e paralisar o avanço de projetos importantes para o Brasil só para tentar livrar da cadeia um completo desqualificado como Bolsonaro? Parte considerável do establishment político parece considerar que sim. Bolsonaro é muito útil para essa turma, pois desde as eleições de 2018 provou-se capaz de eleger muita gente só ao abrir a boca e declarar apoio. Nem sempre foi assim: recorde-se que na campanha de 2018, mesmo aparecendo bem nas pesquisas de intenção de voto, Bolsonaro teve de se abrigar num pa...

Editorial do Estadão, 08/09/2025 - "Apagão diplomático em Washington"

  Apagão diplomático em Washington Lula prefere palanque a diplomacia: enquanto empresários se defendem sozinhos nos Estados Unidos, o governo sabota negociações e cultiva a crise para inflar sua retórica eleitoral Na crise com os EUA, ao Brasil falta Estado e sobra palanque. A audiência pública em Washington sobre as supostas práticas desleais do Brasil – do Pix à Rua 25 de Março, do etanol ao desmatamento – expôs de forma gritante esse vácuo. O contraste não poderia ser mais simbólico: enquanto empresários brasileiros, sem ter a retaguarda de uma embaixadora inepta, defendiam sozinhos seus interesses diante de um inquérito que pode justificar novas tarifas já em 2025, a principal figura diplomática do País – o chanceler de facto do presidente Lula da Silva, Celso Amorim – celebrava um convescote autoritário em Pequim. Não se trata de minimizar a gravidade singular do caso brasileiro. Donald Trump fez do País o alvo preferencial de sua cruzada protecionista e ideológica. Misturou ...

Artigo de Rodrigo Silva, Estadão, 22/07/2025.

Opinião Democracia não pode ser seletiva; ou vale para todos (inclusive para quem detestamos) ou não vale Enquanto esquerda minimiza abusos de Cuba e Venezuela, direita passa o pano para El Salvador e Hungria Por Rodrigo da Silva 22/07/2025 | 09h30 Imagine um país em que um único juiz possa investigar, acusar, julgar e punir – tudo ao mesmo tempo. Um lugar onde a polícia prende por crime de opinião; jornalistas têm as suas contas bloqueadas por decisão de um único ministro e plataformas digitais são ameaçadas com multas milionárias caso não obedeçam decisões altamente questionáveis, sem direito ao contraditório. É fácil apontar o dedo para o Supremo Tribunal Federal . Nos últimos anos, ministros da Corte brasileira foram repetidas vezes acusados de exercer funções típicas de outras esferas de poder e violar princípios do devido processo legal. Como este jornal denunciou tantas vezes, a lista de atropelos institucionais é vasta. À esquerda, o STF vem sendo defendido sob a justificativa ...

Editorial do Estadão, 09/07/25 - "O Estado contra o cidadão"

 Estado contra o cidadão Assassinato do marceneiro Guilherme Ferreira escancara não só o despreparo da PM paulista, como a falência de um modelo de segurança que adota a barbárie como padrão de atuação policial Numa democracia liberal, como é a brasileira, presume-se que as leis e as instituições sirvam para proteger os cidadãos do arbítrio do Estado. No entanto, a julgar pelo ultrajante caso de um rapaz negro assassinado em São Paulo por um policial militar que o confundiu com um assaltante só porque a vítima corria para pegar um ônibus depois do trabalho, alguns cidadãos, a depender da cor da pele e da condição financeira, estão totalmente à mercê de um Estado que não os reconhece como titulares de direitos. Para o marceneiro Guilherme Dias Santos Ferreira, de 26 anos, a democracia liberal não existe. Tudo nesse caso prova a seletividade do aparato estatal na aplicação das leis e dos princípios constitucionais. Primeiro, o policial militar que atirou contra Guilherme, o cabo Fabi...

Editorial do Estadão, 04/07/2025 - "O ministério do ego de Lula"

  O ministério do ego de Lula Ao tratar a opinião desairosa de uma revista estrangeira sobre o presidente como se fosse uma questão de Estado, o Itamaraty se converte em departamento das relações pessoais do petista Tem sido difícil, mas há dias em que o governo de Lula da Silva se supera. Foi o que ocorreu quando o Palácio do Itamaraty – outrora um dos mais respeitados templos da sobriedade diplomática mundial – foi mobilizado para criticar um artigo da revista The Economist. Não uma resolução da ONU, não uma denúncia jurídica, não uma ameaça à soberania nacional, mas uma opinião jornalística. Resultado: uma nota oficial assinada pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira – quiçá ditada pelo chanceler paralelo, Celso Amorim –, que trata Lula como uma espécie de divindade contemporânea, um Buda com barba, ou, vá lá, um Kim Jong-un tropical. Bater boca com a imprensa virou, tudo indica, uma nova função de Estado em Brasília. O próprio presidente do Supremo Tribunal Federal ...

Primeiro editorial do Estadão, 01/07/2025 - "Paternalismo judicial"

  Paternalismo judicial Ao dizer que, não fosse pelo Supremo, haveria ‘213 milhões de pequenos tiranos’ no Brasil, Cármen Lúcia revela que parte da Corte vê o cidadão não como titular de direitos, mas como ameaça A desordem instaurada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) após o julgamento do artigo 19 do Marco Civil da Internet não se desvela “apenas”, por assim dizer, como um erro jurídico. Um erro, eventualmente, pode ser corrigido. O problema é mais grave. Subjaz à confusa decisão da Corte o predomínio de uma mentalidade autoritária segundo a qual caberia aos doutos 11 ministros salvar os brasileiros de si mesmos, resgatá-los da incivilidade e do despreparo para tomar decisões e formar juízos por conta própria. Do constrangedor despreparo exposto por alguns ministros ao voluntarismo manifestado por outros, o páreo era duríssimo. Mas nada encarnou tão bem esse espírito daninho que animou o STF durante o julgamento quanto o voto da ministra Cármen Lúcia. Ao decidir pela responsabil...

Artigo de Carlos Andreazza - Estadão, 28/06/2025 - O Marco Supremo da Internet resultou de um processo autoritário

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Opinião O Marco Supremo da Internet resultou de um processo autoritário Regra criada pelo STF é produto do assalto à atividade de outro Poder, como se não fosse legítimo ao Congresso querer não tratar de algo Por Carlos Andreazza 27/06/2025 | 18h00 O Supremo faz democracia a portas fechadas. Regime chinês admirável. O Supremo onipresente nos salva – nos protege – deliberando em gabinetes trancados, à margem do escrutínio republicano. O Supremo fez democracia – e ninguém pôde ver. Será sempre pela democracia. Sempre em nossa defesa – nós, os bárbaros incapazes, necessitados das luzes dos barrosos, aqueles, os que não têm votos, editores das nossas liberdades. Dias Toffoli , o anulador-geral: o nosso editor. Nós, os “213 milhões de pequenos tiranos soberanos” de Cármen – ex-cala a boca já morreu – Lúcia . Todo mundo está pela democracia. Né? Importante é caçar o rato – talvez o mesmo que a “censura colateral” a que se referiu Fachin em seu voto adulto. Em nome da democracia, sob a Repúb...

Editorial do Estadão, 14/06/2025 - "Supremo instaura terra sem lei na internet"

  Supremo instaura terra sem lei na internet Ao fabricar regras arbitrárias para redes, STF institucionaliza o caos que pretendia regular e atropela o Legislativo, o único Poder com legitimidade para criar limites na internet Formou-se, no Supremo Tribunal Federal, a maioria de votos para derrubar o artigo 19 do Marco Civil da Internet – e, com ele, o delicado equilíbrio jurídico que sustenta há uma década a liberdade de expressão no ambiente digital. Como sempre, os ministros discursaram em nome da democracia. Mas, ao substituir a lei pela vontade de togados e ao instituir um sistema de censura privatizada baseado em critérios nebulosos e voluntaristas, é exatamente essa democracia que estão dilapidando – e com zelo quase missionário. A regra consagrada no artigo 19 é simples e civilizada: plataformas digitais só podem ser responsabilizadas por conteúdo de terceiros se, após ordem judicial, se recusarem a removê-lo. Essa exigência serve a um propósito elementar do Estado de Direit...

Primeiro editorial do Estadão, 06/06/2025 - "Quando piada dá cadeia, salve-se quem puder"

  Quando piada dá cadeia, salve-se quem puder Punir piadas é sinal de fraqueza institucional, e não de justiça. O humor é parte da liberdade que protege o que nos incomoda, e uma sociedade plural não sobrevive à criminalização do riso A condenação de um comediante à prisão marca um ponto de inflexão alarmante na trajetória democrática brasileira. Mais do que um veredicto equivocado, é a expressão mais grotesca de uma tendência crescente: a criminalização do discurso incômodo sob o pretexto de proteger os vulneráveis. A toga virou armadura ideológica, e o Código Penal, instrumento de censura. Léo Lins foi condenado a oito anos de cadeia e quase R$ 2 milhões em multas e indenizações, não por incitar violência ou praticar atos concretos de discriminação, mas por satirizar grupos sociais. Seu humor seria “preconceituoso”, “humilhante”, perigoso. Nada mais perigoso, no entanto, do que essa nova ortodoxia judicial que confunde o direito de não ser agredido com um suposto direito de não s...

Terceiro editorial do Estadão, 27/05/2025 - "Ataque à razão"

  Ataque à razão Trump ameaça a alma universal de Harvard em nome de seu populismo xenófobo Depois de tentar, sem sucesso, dobrar a Universidade Harvard a seus desmandos pela via da constrição financeira, o presidente dos EUA, Donald Trump, retomou a ofensiva contra a prestigiosa instituição atacando sua alma: a abertura de Harvard para as melhores cabeças do mundo. No dia 22 passado, Trump revogou o certificado que permitia a matrícula de alunos estrangeiros naquela universidade. A prevalecer a sanha persecutória de Trump, ora interrompida por decisão de uma juíza federal, Harvard não apenas ficará impedida de matricular cidadãos estrangeiros, como aqueles que já estão matriculados em seus cursos terão de ser transferidos para outras universidades, sob pena de se tornarem ilegais nos EUA. De acordo com o site ShunStudents, no último ano letivo quase 6,8 mil estudantes de Harvard eram estrangeiros, o que representa cerca de 30% dos alunos da universidade. Mais de 300 brasileiros, e...

Primeiro editorial do Estadão - 27/05/2026 - "Quem deve teme"

  Quem deve teme Promessa de ‘governo transparente’ virou fumaça. Governo Lula multiplica sigilos, oculta gastos e restringe acesso a documentos públicos, expondo o engodo da ‘frente ampla democrática’ Durante a campanha eleitoral, Lula da Silva agitou a bandeira da transparência como um dos ativos morais de sua candidatura. Em mais de uma ocasião, fustigou o governo anterior por ocultar informações do cidadão: “Se é bom, não precisa esconder”, disse o petista a Jair Bolsonaro durante um debate. Já instalado no Palácio do Planalto, em maio de 2023, Lula afirmou que a Lei de Acesso à Informação (LAI) havia sido “estuprada” e prometeu recuperá-la: “O povo brasileiro vai ver essa criança se transformar em adulto”. Dois anos depois, essa criança continua sendo violentada – agora, por aqueles que juraram protegê-la. Há mais de um ano o governo bloqueia o acesso a cerca de 16 milhões de documentos que, por 17 anos, estiveram abertos ao escrutínio do cidadão: notas fiscais, termos de parc...

Artigo de Marcos Mendes e Bernard Appy, Estadão, de/01/2016 - "Injusto, ineficiente e caro"

Injusto, ineficiente e caro Por MARCOS MENDES E BERNARD APPY 22/01/2016 | 03h55 A cidade de Dois Irmãos das Missões (RS) tem 2,2 mil habitantes e recebe do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) R$ 2,9 mil per capita. Como é uma cidade pequena, não tem escala para oferecer serviços públicos diversificados: são poucos os adolescentes para que se abra uma escola de ensino médio, não há doentes graves em quantidade que justifique um hospital para casos complexos. Por isso, boa parte do dinheiro do FPM é gasta com a burocracia. Só a Câmara Municipal consome 10% da receita corrente. Águas Lindas de Goiás (GO) tem 182 mil habitantes. Fica na periferia de Brasília. Sua população cresceu 22% nos últimos dez anos. Há forte necessidade de urbanização, muitas crianças em idade escolar, violência e pobreza. Mas o FPM, que põe muito dinheiro em 2 mil municípios pequenos, destina apenas R$ 334 per capita a Águas Lindas. Isso é injusto, o dinheiro não vai para onde é mais necessário. É ineficient...

Editorial do Estadão, 25/05/2025 - "Uma casta acima da lei"

Uma casta acima da lei A condenação de uma jornalista por divulgar dados públicos mostra que a toga virou escudo. E o Judiciário, uma corporação que intimida críticos e se protege sob o manto da honra ofendida A condenação da jornalista Rosane Oliveira e do jornal Zero Hora pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) a pagar R$ 600 mil por divulgar a remuneração de uma desembargadora é mais do que um erro judicial: é uma violência contra a democracia liberal. A sentença não só ignora o direito fundamental de acesso à informação, como representa um ataque frontal à liberdade de imprensa – um dos pilares de qualquer sociedade aberta. A desembargadora Iris Medeiros Nogueira, quando presidente do TJ-RS, teve vencimentos de R$ 662 mil em um único mês – quase 15 vezes o teto constitucional – reportados com base em dados do Portal da Transparência. A própria sentença reconhece que os dados publicados eram “públicos e verídicos”, mas condena a jornalista por uma suposta “linguagem sa...

O Coliseu Moral - Artigo do Prof Wilson Gomes para os assinantes do Canal Meio -16/04/2025

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  O Coliseu moral Como a superioridade moral se tornou o prêmio máximo na política contemporânea     Por Wilson Gomes Muito se fala hoje do tal exibicionismo de virtude — expressão usada para criticar aqueles que ostentam em público sua suposta superioridade moral. Costuma-se ver nisso um problema de autenticidade: acusa-se o agente de dizer o que é certo, mas sem viver de acordo com o que prega. Mas há algo mais profundo em jogo. A exibição de virtudes não depende, necessariamente, da insinceridade. Mesmo atos sinceros, motivados por convicção real, podem entrar nesse regime performativo quando passam a integrar uma lógica de visibilidade moral que funciona como capital simbólico. O problema não está apenas na falsidade. Está, sobretudo, no uso recorrente da virtude como instrumento de distinção, de afirmação pública e de mobilização afetiva. Não é preciso que o gesto seja hipócrita para ser exibicionista. Basta que ele funcione como espetáculo — um teatro moral voltado ...